Carta aberta ao Ceni
Tuas falhas, humaníssimas, foram motivo de gozo dos secadores. Um orgasmo múltiplo |
AMIGO TORCEDOR, amigo secador, não é fácil ser goleiro, e mais difícil ainda é ser um Rogério Ceni da vida, o homem, o mito, como dizem os fãs do tricolor paulista. Há quem diga, entre os supersticiosos, que goleiro que vaza goleiro, seu irmão de ofício, sofre um castigo a mais, além dos infortúnios óbvios da função mais ingrata da existência.
Duvidemos de tal crença, caro Ceni, afinal de contas teria um passivo centenário para gastar nesse purgatório. Tens, na real, é crédito de sobra, o mais é despeito contra teu histórico de correções.
Muitas vezes, inclusive aqui nesta crônica, peguei-me ranzinza com o teu estilo. Daí, entendemos, esse deleite dos torcedores adversários.
Essa gozação generalizada, meu rapaz, desde o jogo de domingo contra o Corinthians. Não apenas pelos 5 a 0. Por aquele gol conhecido vulgarmente, pela plebe rude, como frango.
Aí quis o destino, nesses dias em que Deus acorda corintiano, que foste traído pela bola de novo, contra outro alvinegro, eis a sina, o Botafogo.
Da calçada do Charme, na Augusta, às redes sociais, não se falou de outra coisa. Tuas falhas, humaníssimas, foram motivo de gozo dos secadores. Um orgasmo múltiplo.
Como nos nossos encontros, sempre reclamaste, cordialmente, do corvo Edgar, confesso: a minha pobre ave não assina este agouro. Força, meu caro, sei que, como líder e virtuoso, semeaste alguma antipatia no caminho. Uns diriam até uma certa arrogância, talvez confundindo tua firmeza com a falta de humildade.
O brasileiro ama quem abaixa a cabeça em demasia e deixa ser flagrado nas suas vergonhas.
Avante, Ceni, lutas por tuas causas, e eis um exemplo de dedicação para os tricolores, como o Adriano Souza, de São Miguel Paulista, um são- -paulino no meio de um bando de loucos, como ele diz, na sua comuna nordestina.
Um cara que te admira, Ceni, e com quem troquei a ideia desta carta. "No horário do jogo, pressentindo o pior, com um time desfalcado, saí com minha amada para um sorvete no Jd. Helena e um passeio pelas ruas frias e quietas da ZL", conta. Reparas que romântico: "No segundo tempo, trancafiei-me com ela no quarto e ficamos a ver Discovery Channel e a vida das baleias em algum oceano gelado".
Claro que nem carece contabilizar aqui, Ceni, os seus créditos ou passar em videoteipe a sua glória. Como é dura a vida de goleiro. Nem um mito é blindado em momentos de falhas.
Texto retirado do jornal Folha de SP - 01/07/2011
Um comentário:
LAMBEÇÃO DE SACO, HEIN?
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